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Os Caminhos das Ararunas e o sonho de uma trilha do Oiapoque à Barra do Chuí

Os Caminhos das Ararunas, no sertão paraibano, unem natureza, história, aventura, cultura e muitas oportunidades de desenvolvimento local sustentável ao longo dos seus mais de 100 quilômetros

Rogério Ferreira ·
9 de agosto de 2021 · 3 anos atrás

A Trilha Caminho das Ararunas foi pensada para ser uma estrada 100% natural, entre os municípios paraibanos de Riachão e Cuité, que cruza o município de Araruna, sendo uma ecovia com mais de 100 quilômetros. O percurso serpenteia entre serras, cânions, vegetação xerófita (adaptadas ao semiárido), resquícios de Mata Atlântica, rios e riachos em sua maioria intermitentes, pertencentes à bacia do Rio Curimataú, sobre o Monte das Gameleiras, .

O que atualmente passou a ser denominado de “Caminhos Das Ararunas” são as trilhas abertas por animais domésticos e moradores da região para acessar lugares remotos em busca de água, lugares agricultáveis ou mesmo para encurtar distâncias criando “atalhos”. Ao longo destes caminhos são encontrados dezenas de sítios rupestres, como pinturas, material lítico, solos com “machadinhas” e outras rochas trabalhadas como ferramentas na pré-história, assim como registros de uma história mais recente, como casarios e capelas em ruínas da metade do século passado. Outro destaque são as assim chamadas pareidolias, fenômeno que faz as pessoas reconhecerem imagens de rostos humanos em diversas superfícies, como blocos rochosos, que no caso dos Caminhos das Ararunas renderam batismos como a Pedra do Nariz, Pedra do Chapéu, Pedra da Caveira e Pedra da Boca. Estas últimas todas convidativas ao trekking pesado, rapel, escalada, vôo livre, mountain bike e outras práticas de aventura na natureza.

Com o objetivo de catalogar estes ambientes históricos, culturais e ecológicos em meio a prática das caminhadas na natureza, de outrora, e associado ao pensamento de unir todos estes caminhos, surge então a trilha de longo curso Caminhos das Ararunas. O percurso tem como motivação uma meta ambiental, trazer de volta as araras-azuis à região, e outra social, levar as pessoas para frequentar, mesmo que de passagem, as comunidades isoladas conectadas pela trilha.

Acampamento durante a caminhada nos Caminhos das Ararunas. Foto: Ricardo Câmara

Estes dois elementos, que serão usados no futuro como o indicador de sucesso dos Caminhos das Ararunas, são fatores de destaque nesta trilha para agregar valor à prática do trekking no local. A cada passeio ou caminhada, todos estarão contribuindo com a inclusão social de comunidades remotas na economia solidária e com a iniciativa de reintroduzir as araras na região, através do fomento ao uso sustentável e da difusão da importância da conservação da natureza no local. A região atualmente ainda tem a caça como forte atividade financeira e uma cultura imediatista que muitas vezes resulta na degradação da natureza em prol da sobrevivência imediata. Este encontro direto ou indireto entre os Caminhos das Ararunas e as comunidades locais servirá como ajuda para promoção da conservação da paisagem natural, da esfera local à nacional.

A trilha, enquanto Caminho das Ararunas, é reconhecida e interligada ao projeto maior da Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso, que busca interligar o Oiapoque ao Chuí, nos extremos norte-sul do país. Dentro deste projeto de consolidação desta gigantesca malha ecoviária nacional, esse trajeto interno municipal garante mais uma das muitas etapas necessárias para efetivação deste grandioso caminho natural. Por sua localização geográfica, inclusive, em Ararunas os trilheiros estarão próximos ao “Extremo Oriental das Américas”, que tem como marco físico o Farol do Cabo Branco, na Ponta do Seixas, distante cerca de 130km deste percurso, em João Pessoa, capital do estado paraibano. Este seria mais um ponto histórico e geográfico de significativa importância nesta missão de unir os extremos norte e sul entre Oiapoque e Chuí, passar também pelo ponto mais extremo à leste das Américas.

Mesmo ainda em vias de finalização do processo de sinalização, com ajustes pequenos a serem feitos no trajeto total, a trilha já está sendo bastante procurada por trilheiros e agências de turismo de todo o Nordeste e outras partes do país inclusive. Tanto pelo sucesso da divulgação alcançada, quanto pela ajuda inesperada do chamado “fenômeno Juliette” (paraibana e ganhadora da edição do reality show Big Brother em 2021) que comentou sobre uma aventura sua em um dos geossítios da trilha, a Pedra da Boca, no Parque Estadual Pedra da Boca. Quem, por ventura, envolto no espírito de aventura, queira buscar fazer o percurso já encontrará condutores preparados para o guiamento. Todos eles incluem na sua capacitação a Gestão de Riscos, Atendimento Pré Hospitalar em Áreas Remotas e conhecimento dos lugares de apoio logístico ao visitante, ao longo de todo o trajeto.

A trilha de longo curso Caminhos das Ararunas é um exemplo de iniciativa popular, solidária, participativa e democrática para a construção de um lazer que, antes de qualquer realidade atribuída ao ganho pessoal do visitante, eleva a autoestima dos que lutam pelo ideal de conservação, contribuindo com a luta por um país que passe a reconhecer na prática os benefícios de uma natureza preservada para a saúde e nosso próprio bem-estar, assim como para economia e em respeito aos demais elementos vivos da natureza e a nossa condição de viver nesta nossa única morada que é o planeta natureza chamado Terra. Venha viver a natureza nas trilhas de longo curso a partir dos Caminhos das Ararunas na Paraíba.

Assista a live da Rede Brasileira de Trilhas em parceria com ((o))eco sobre os Caminhos das Ararunas:

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Comentários 1

  1. Antônio Ferrair diz:

    Geograficamente os extremos do Brasil, são o mente Caburai e o município de Santa Vitória do Palmar-RS, aonde fica a Barra do Chui. Para esclarecimento a Barra do Chui,não pertence ao território do município do Chui… Esta equivocado “do Iapoque ao Chui”, o correto seria do Monte Caburia a Santa Vitória do Palmar.